Vamos olhar com maturidade para o diabo




Texto de Victor Garcia Preto
 
Precisamos amadurecer nossos conceitos com relação a uma figura tão temida e tão explorada. O Diabo.
Há quem acredite que a visão mais madura possível é ter a concepção de que ele não existe. Discordo. Pelo menos, parcialmente.
É fato que em muitos momentos as pessoas culpam o diabo e qualquer elemento sobrenatural pelos seus próprios erros e frustrações. Mas é preciso separar cada aspecto. "O maior truque já realizado pelo diabo foi convencer o mundo de que ele não existe", atribuída a Charles Baudelaire (1821-1867), também é uma frase bem famosa.
Minha linha de raciocínio parte da perspectiva cristã, que ele existe. Ou pelo menos, existe o mal, a ausência do bem, que em nossa mente limitada, personificada em sua figura.


E a questão está simplesmente nesse ponto. O diabo não é assustador. Muito pelo contrário. Não estou afirmando que se trata de uma criatura legal, que deve ser menosprezado ou causar simpatia. Mas a ideia de uma criatura com aspectos humanoides e de animais, pelo vermelha, rabo, par de chifres e cheirando a enxofre é uma visão imatura do "inimigo". O diabo não tem a aparência de um vilão de uma animação infantil. Sua aparência é nobre, atraente e cativante. Ele não parece ser o que é. Causa muita confusão.


Pode ser difícil admitir, mas ele é belo. É gentil, suave e tem a fala doce. É praticamente alguém acima de qualquer suspeita. É o sorriso encantador, a música relaxante, o beijo saboroso. Manipula, e propaga seu discurso através de instrumentos manipulados. Sua perversidade está camuflada nas falas da menina virgem, do rapaz inocente, das pessoas aparentemente sensatas. Se apropria das dores humanas para distorcer suas causas e consequências. Manipula o discurso dos injustiçados ou dos que parecem ser. É a traição com um beijo. A declaração de guerra jogando rosas para o alto. A tragédia anunciada através de piadas. Veio para confundir. Por isso sua aparência - física e comportamental - é totalmente oposto de sua essência.


É obvio que em muitos momentos, líderes religiosos são instrumentos de sua perversidade. Mas muitas vezes aqueles que os combatem. Escritores, dramaturgos, cidadãos de bem. Todos já serviram de alguma forma aos planos dele, muitas vezes por inocência, em outros, por diversos motivos.


O diabo é o amigo descolado, que apresenta um mundo fantástico, porém, ilusório. Em sua companhia tudo é diversão, relaxamento e soluções para todos os problemas do mundo. É o mundo ideal, até o vício em drogas, as dívidas e a ausência de saúde se mostrarem consequência. Deus é a figura paternal. Muitas vezes quem "poda" nossas asas, nos impede de realizar determinados desejos, muitas vezes é "careta". Porém, é o que nos impede de fazer besteiras. Muitas vezes a figura de Deus pode aparentar ser retrógada e ultrapassada. Enquanto a figura diabólica como a vanguarda, a ruptura com o velho mundo imperfeito com a nova tendência, totalmente "cool", sem as amarras e injustiças de outrora. Uma pena que seja apenas a isca para iludir a humanidade.


Está nos pequenos fatos do dia-a-dia, nas pequenas curvas e vírgulas. Naqueles minúsculos erros que aparentam não causar problemas. Tem bons argumentos, que inicialmente parecem fazer sentido. É intolerante, mas prega o amor. Em seu discurso se preocupa com as causas sociais, mesmo estando olhando sempre para o próprio umbigo. Nunca revela suas intensões, sempre com voltas, com rodeios, com desentendimentos. Sabe muito bem os canais para propagar pequenos fragmentos de sua pervercidade.


Está nas teorias da conspiração e nas acusações de conspiração dos fatos reais. Se faz presente na incompatibilidade de gênios entre familiares. Se aproveita dos defeitos humanos. Principalmente a ingenuidade e a burrice. E nessa perspectiva é preciso ser muito maduro para entender, que em algum momento, todos nós nos deixamos ser manipulados pelo diabo.
No pequeno erro que pode prejudicar ou ajudar a prejudicar o dia de alguém. Na irritação exagerada na fila da padaria, a pequena confusão no trânsito. As ideias estúpidas, que mesmo que sem perceber, incomodam e prejudicam diretamente outras pessoas.


Um abutre que se aproveita de situações peculiares para causar inimizades e intrigas. Em conflitos que aparentemente são irrelevantes para seus planos. E por isso, geralmente não está atribuído a ele. Está nas macro e micros tiranias, daqueles que acreditam ser capazes de representar e/ou controlar um grupo, ou mesmo um único indivíduo. Nos lindos discursos, mas com ações que na prática não se justifica. No pai de família que se torna um leão para defender os seus, mas está errado. Nas histórias mascaradas de bravura, onde se escondem fatos importantes e transforma em puro a podridão.
Atitudes estúpidas, com justificativas nobres. No justiceiro, que se apropria do sofrimento alheio como seu discurso, mesmo com pilares distorcidos da informação.
Está no processo de descredibilizar pessoas que fazem seu trabalho de formiguinha contribuindo para o mundo melhor. Nos puxa-sacos, nos prepotentes, nos soberbos. Nos canalhas. Na distorção do passado, presente e até mesmo no futuro.


O diabo não é o inimigo oficial. É o que pouco aparece, porém, tem muito poder. Algumas vezes visto como um moderador, para equilibrar os "inimigos oficiais" e muitas vezes para corrigir supostas injustiças. E principalmente, nunca tem uma posição definida. Sempre se coloca acima das opções e escolhas.


O diabo é demagogo. O maior de todos. Bajula. Exagera nos elogios. Trata seus potenciais escravos a "pão de ló". Os escraviza pelo ego.


E vale ressaltar que durante muito tempo, o diabo viveu lado a lado com Deus. E com sua perspicácia, faz muitos pensarem que é Deus o traidor. Seu prato preferido é a ignorância.


Suas vestes são a hipocrisia. Seu perfume, a demagogia. Escova os dentes com a incoerência. Se banha com o fingimento.
É a cobra que não rasteja, e tão pouco precisa dar o bote para espalhar seu veneno.
Se uma de suas maiores artimanhas é fazer acreditar que não existe, usar de falsos perigos a serem combatidos como estratagema para causas impuras. É muito fácil cair em seu discurso, o difícil é combatê-lo.


O Diabo não deve ser usado como muleta para todas as nossas falhas, porém, deve obter a importância que merece. E não se deve subestimá-lo, ou tão pouco, enxergá-lo de maneira imatura.
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Sobre o Autor: 
Victor Garcia Preto   
Formado em Ciências Contábeis. 29 anos, Resido Ribeirão Preto.  Tenho um perfil de textos no Instagram: @textosinceros. Segue lá.

              

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